Eu tenho sorte de não ser carroceiro a chicotear os bois que puxam
o carro.
Eu tenho sorte de nem ter uma carroça, porque não me perco entre
tempestades, borrascas e estradas de barro que levam para
lugar nenhum.
Eu tenho sorte de enxergar e não esquecer o que vejo, porque, se
dependesse apenas dos meus pés a guiar meu caminho, despencaria
montanha abaixo.
Sou um que não sabe ao que veio - como se alguém soubesse!
E , se sabem, inventam que aquela é a sua própria estrada,
que, por ela, só eles podem de passar.
Porém, possuo a imaginação.
Ela é a minha carroça, os bois e o caminho.
Por onde essa minha carroça imaginária me leva, é aquele
que o instinto me aponta e eu me deixo levar.
Não luto, não opino, me transporto.
Cada animal é meu inconsciente, visto que meu consciente é como
o de um bêbado, que bebe para não ser notado à noite nem por ele,
embora cada pisada sua ressoe pelas paredes e pelas montanhas
como um trovão, e os que moram nas redondezas se perguntam:
- quem passará à esta hora da noite? sorrio tonto e sigo distraído.
Mas, aonde chegar?
O que verei lá, talvez não importe, e sim o próprio ir, a própria
viagem sirva ao meu propósito, diria um monge hindu.
Tento continuar à cada dia que segue, como todos fazem, porém
não quero mais reclamações.
O horizonte nasce claro e limpo, como o dia que quero galgar.
Minha carroça é lenta, mas chegará.
Os animais são dóceis e fortes, se lambem e comem na minha mão.
Sei que chegarei vivo ainda e para o último copo!
Ponham a mesa.
Sirvam o prato e tenham bom apetite!
O certo é que não deixarei o café esfriando.
Os animais precisam descansar!
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