terça-feira, 6 de julho de 2010

O jantar está servido



Sem ti
toda alma prova o gozo
do sentimento desprovido
de toda grandeza
a solidão de prosseguir o almoço
sem ter ninguém a brindar o vinho
ou ninguém sentado
em torno à mesa

Mas, que fazer
se nada ou se ninguém interessa
quando nada lhe preenche
nem cresce, ou o prende
e toda surpresa súbito cessa
e até lhe traz angústia
por temer o que vem pela frente

Porém, como de novo
esquecer o temor
de como enfrentar as horas
se o que vem à noite
ainda é o vão de sua forma
o estrondo vazio
do que não lhe questiona mais
do que não lhe responde mais
do que não desarruma a casa mais
e depois não lhe abraça

e até lhe evita
se o acaso maldoso
faz com que se encontrem
para que aconteça
como uma traição
ao que à si próprio jurou
de jamais ter atitudes rudes
ou indignas
nem em legítima defesa

Voltando
então, à casa
tudo acentua a
abstrata lacuna
que tudo contorna
de um nada presente
que dentro em si constata
a ausência que não lhe deixa

E continua
por lhe evidenciar seu engano
e por sobrar tantos ecos
ressoando por todos os cantos
da lacuna, de seu apartamento
no vácuo de sua inexistência
como única prenda
como único bom dia
como único cumprimento
que não mais existia                                                                                           



Entretanto
o amor é assim
como o nascer do dia
que chega de mansinho
se escondendo
por trás da montanha
ao alvorecer
e pensamos, esperamos
a luz e o clarão
que viria a acabar
toda obscuridade estranha

Sabe-se porém
que, um momento, ele terá fim
como tudo que de vida se entranha
e o frio e o escuro deste ínterim
se ameniza nas imagens e lembranças
que a memória feliz
por graças ganha

Até que se olhe atento
ao sempre ali
velho e conhecido horizonte
e vemos de novo
de repente, o dia surgir
com seu céu à tudo iluminando
por trás da montanha




Mas, não se vê nada ainda
nem entendemos o que se passa
pois se nem janela temos
que agora por milagre
na mente achamos
e olhamos ávidos
o que há através da vidraça

e aí imaginando tudo
o cenário e os personagens   
a ser como sempre amamos
e realmente tudo volta à luz
não mais nos assusta
nem mais nos amedrontamos

Então sem perder tempo
corremos e pomos a mesa
pois um convidado não esperado
à nós, a luz trouxe
e já ali bate à porta,
sem mais nem menos
pois revelou o que não víamos
ser tão claro
quando a mente está acesa

e então trazemos
tudo de melhor
que há para jantar
que à ele, com prazer
será servido
para que esse alguém
nos diga contente e comovido 
bom apetite!
e nós escutemos por dentro
O jantar está servido!
E adeus, lá se foi a tristeza!



                                   
 4/11/2007

                                  
                                  
                                                                      pintura- La salle à manger sur le jardin - Bonnard