Eu sou o Marcos Vasconcellos. Aqui eu escrevo o que me der na telha, o que me vem na hora de dormir, quando estou num onibus, ou no meio de um papo chato!
domingo, 9 de maio de 2010
Às vezes
às vezes, penso em desistir de tudo
quando eu sinto que os pés não me obedecem
e se recusam a dar um passo adiante, por menor
que seja a distância a percorrer
lá fora tudo continua em seu ritmo atordoante
de planeta girando,de roda gigante, enquanto eu me travo
desordenado
como se tivesse construído uma gaiola imaginária
em torno de mim
daonde observo o que acontece
encolhido em um cantinho
absorto em delírios de impossibilidades e fatos extraordinários
e excêntricos que me surgem e se materializam
com os sons que escuto por trás das paredes da discrição
e percebo
que um mascote que late
que o vizinho que vê tv com o som nas alturas intergalácticas
enquanto, seu rosto em transe, faz parecer que dorme
um casal faz sexo como locomotivas num terremoto
voam risadas sobre o patético show
e eu
estou só
penso em desistir de tudo
e a noite não me ilumina
se acomoda em seus barulhos apagados
ou algazarras de farras invejadas
ou em sua colcha de céu apagado e indiferença
a embrulhar os casais sem surpresas
as famílias
e os solitários
os namorados
os desesperados
os alegres
as camas vazias
e os bêbados de cada esquina
penso em desistir de tudo
mas como desistir de mim
desistir de ser
a não me entender como eu
pessoa à pensar
pessoa à agir
pessoa à rir
pessoa à correr
pelos dias procurando o próprio ser
que em sua pessoa existe
como existe a percepção
de que um carro sobe a ladeira
violinos musicam outros andares
o silêncio dos grilos na floresta
o roçar das patinhas de um inseto perdido num mato qualquer
a fazer cricri
musicando o escuro
e depois o nada
penso em desistir de tudo
porém, não de mim
mas, do que pensei
porque não lhe vejo os frutos
não lhe colho as sementes
não rego os brotos
então, resistirei e tentarei com as minhas mãos
desenhar o meu caminho ainda em folha rascunhada
sair do esboço
fazê-lo surgir até onde quero
revelar o mistério que perdi em alguma noite e que se esconde
inconformado
em algum bar, num último copo de insatisfação
cansado de esperar meu olhar
tenho fome de ser eu mesmo
tenho a ânsia de insistir, de tentar o destino a seguir
a permitir ao que se tem pela frente
delimitar o imensurável do acima
a sonhar sobre a minha angústia
até que ela se liberte do meu nada
e venha a ser mais um dia pleno
dentro de mim
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