quinta-feira, 11 de março de 2010




















Lento, lento tudo que passa
e, no entanto, à mim
é como um foguete rugindo
como é relativa a percepção, frágil sentido
a noite tão calada
e o dia
a balbúrdia de uma criança que nasce.

Mas, à noite, a cabeça fica zunindo
mesmo parada
e mesmo sendo
que tudo fosse o que fosse
viro a folha, luto mais
me animo.

Mesmo que o sentir
não estivesse mais se cumprindo
É dia. O porteiro varre,
a multidão acorda, continua,
os políticos falam de suas idéias
em que não se acredita,
o homem é falho, a ética finita
o povo passa, tudo se mexe, pulsa
é frenesi,tudo irrita

Quem não é louco?
Quem não é biruta?
é tudo a mesma coisa de sempre
nada de novo!
O tempo é um nada
que percebemos devagar
não existindo

E lentamente
tudo se vai, escoa, vaza.
Cada qual em seu tempo,
areia caindo

Mas, uma mosca
surge por acaso
bordando o ar, e passa
o telefone toca
é uma nova chance
de se saber de quem se ama,
é uma chance de ter alguém
te ouvindo

O tempo é contado
O tempo se esgota
O tempo é infindo


Se eu tivesse ainda a ti
e esse oceano não nos separasse
e as ondas não me levassem pra longe
do que de ti me restasse
e ali achasse o que me completa
mas, aonde?

Como sair desse impasse?
e se eu tivesse ainda todo o tempo
que eu a brincar não sabia que tinha
se ainda fosse ligeiro
se eu corresse, jogasse queimado
se toda esta vida
fosse um só dia inteiro
um mínimo que passou
uma fração que voasse
mesmo que fosse fingindo?

estaria eu a ver esse rio vazio
estaria eu nesse barco sem destino
Ah, se eu tivesse ainda a mirar a distancia
e se cercasse meu silêncio
com teu rosto sorrindo

não seria uma maneira de reaver os meus anos
não seria pegar um bonde partindo?
iria até a estação onde te veria saltar
para encontrar nossos olhares remotos
e aquela algazarra
que em nós vivíamos ouvindo?

mas, a rua é deserta
e quem não passa
não sabe das horas se indo
Eu me sento num banco num dia quente
e percebo o movimento, as lojas se abrindo
mais uma manhã que chega
mais um dia a sentir fugindo.

Além de Sófocles


Que me importa toda tragédia grega? Não quero extremos, procuro o banal. Há mais méritos em transcender o comum ou fechar as mãos aos céus e suplicar? Ou mesmo andar levando o peso do mundo às costas - insanidade? Ou ainda medir com passos o rio que se forma de nossas angústias e temor? Prefiro os caminhos simples. Em torno dele, desenho com os olhos uma solução minha e faço que por mim, seguindo essas linhas, como um fio de Ariadne, que tudo se desfaça, e o caminho surja livre, claro, salvador. A intensidade do que penso me revela os umbrais do se que faz o possível. Invento, crio. Minha humanidade treme, se espanta, se eleva por degraus aéreos. Aparto o que há por dentro em mim, para que se levante de mim o inverso de mim, a clareza, até chegar a atônita Fonte do Eu Perfeito, onde saciar minha ansiedade. Mas, eis que em sua margem me encontro em espectro. É tarde, admiro-me, narciso-me. Meu corpo agora é pedra. Minha faina factora a flor ad aeternum - mirabilis est.