sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Um pequeno furo



pra que serve
nesse espaço obscuro
tatear o que circunscreve
sem razão
um pequeno inexpressivo furo?

à menos
que seja a esperada porta
que aberta
eu veja tudo que me importa
e tateando lhe descubra a fechadura
como escondida dentro de um muro
                                                                                                             


e o furo apenas sirva
como buraco da fechadura
para a chave viva
na cabeça dessa criatura emparedada
que não enxerga
não vê o que deveria já saber
em vez pretender o impossível ofício
de imaginar para que serve a sorte que lhe foi dada

esse pequeno ponto cego
esse claro orifício
esse claro vazio
que chama o que lhe resgata
de ser apenas uma passagem comum
do fácil ao difícil
para a que precisa ser vivida
para não ser mais trancada


talvez se importe apenas
em descobrir montanhas
e ir às alturas
sentindo só as coisas pequenas
crescendo e ascendendo
acendendo a sua morada às escuras
a luz que destranca a chave do enigma
e que ali não há nenhuma armadilha

e diz que a vida é a porta
e essa
que é como um pequeno furo
por onde só passa
quem lhe dá a senha imaginária
que a porta sempre esteve aberta
para quem vê no escuro crú e sofrido
que é esse mesmo o caminho
para o País Infinito das Possíveis Maravilhas


                                                                                                                                       foto de Lars Henkelz