Eu sou o Marcos Vasconcellos. Aqui eu escrevo o que me der na telha, o que me vem na hora de dormir, quando estou num onibus, ou no meio de um papo chato!
domingo, 14 de março de 2010
como se retorce
e se espalha a natureza
o que desabrocha hoje
amanhã já não se vê o pó
tudo é leveza
o já é passado
o hoje
uma fração perdida
entre as migalhas esparsas
de um lanche esquecido
sobre a mesa
Se contarmos
agora,
os dez dedos da mão
à palma e ao braço
e antebraço
unidos estarão
do nascimento ao último sopro
se cuidarmos com boa sorte
e um pouco de precaução.
Se calamidade nenhuma
os separa da vizinhança viva
e à alma presa
o que a vida não desune
a morte o faz como empresa
Porém, desta dita
não me leva a fortuna
não retenho
não resisto
não oponho
entrego "la plata"
dou benvindo a gatuna
Mas o bem que oculto
é mistério
cuja senha são poesias
sussurradas uma à uma
E se atento escutares
e levares à sério
aí não terás mais
infelicidade alguma
No entanto,
se são o beijos que são o encanto
eles que serão as bênçãos
sussurradas uma à uma.
A selva - primeira versão
Depois de longa jornada, campo lisos e vagos. A noite é calma e pensamos ali é o esteio, o repouso enfim. A viagem é finda, as estradas o passado. O pior já fora. O selvagem chamado da aflição, fim de nosso animal entranhado na herança inocente de nossos pais, está perdida no tempo, no esquecimento, um eco na distância - tudo apagado pra mim. Depois de arrasada a selva, a civilização interpõe-se, clarão e ordem. Pois, eis que então percebemos a cidade onde estamos. Temos a impressão que agora tudo podemos. Há paz, um suporte, a segurança de um método, da organização. Nossas cabeças se recostam em encostos macios, um vento sopra - o vento da ilusão. Pois, a selva não seria a selva, se não fosse indomável, incontrolável violência, eterna e inescrutável. Ela vence escondida e se entremeia, fecunda e se reproduz traiçoeiramente. Nós somos, pois, o seu adubo e as suas sementes, o avanço de sua fronteira verde e medonha, as ambições sangrentas de seus dedos galhos. Suas aflorações são alimentos do poder, abraços do terror e da brutalidade, seus infindáveis caminhos perdidos entre as palavras e de um calor úmido - as cidades perdidas, nossos corpos. É como perceber-se de repente, entre plantas famintas e a ganância de tesouros imaginários, entre monstros, feras, insetos, perdições e seus pusilânimes e rastejantes seres famintos ali, novamente, no seu mundo, nosso lar. Para a natureza pura e imaginária de nossos sonhos, apenas os desejos de sobrevivência e beleza é que renasceriam. Mas o que estará ali oculta realmente, desde então, será a verdadeira selva... a selva, a selva. Nem má, nem boa, mas quem nos leva e guia - a inocência, a ignorância. Apenas quem sobrevive lá vê a origem: - a selva, a selva, a selva - o rude cimento de nossas emoções. Quem nos tenta entre o torpor e o calor macio? As traições tem garras impiedosas - o inesperado, o cruel, o poder, o sem esperança, o desespero, o sem escrúpulos. Onde está o meu Deus? Por favor te imploro e me guia, e me diz, e me explica, e me ilumina porque à frente de mim está a escura, impiedosa, indiferente, a urbana selva continua a brotar sempre atrás de cada pensamento e ambição de nossos tolos corações quase domados. Escuta! Rugidos! Fujamos! Para aonde? Estamos perdidos? O paraíso se esconde entre as sombras e o negror das folhas.
a lua chama
a mariposa voa
a luz da chama
a mariposa à toa
a luz é chama
a mariposa vem, voa
a luz da lua
a luz da rua
a luz da chama
a luz é boa
a mariposa se engana
a luz magoa
queima uma patinha
queima outra patinha
queima uma anteninha
queima um olhinho
queima um cantinho
vai o corpo inteirinho
cinzas, pó, sujeira
acumulados
num escaninho
a lua chama
outra mariposa voa
a luz da chama
a mariposa vem
à toa
o amor é assim
sorri
voa,voa,voa...
Era uma vez
uma gaivota tonta
que de si
não podia tomar conta
E a cada vez
que no alçar voo
fez o que fez
à tudo embaralhou.
Até que entendeu
que a natureza
lhe comprometeu
no jogo da presteza.
Assim, hoje em dia
sabe o jugo terrível
e toma a primazia
do que é possível.
Pois, percebeu além
do que imaginava
que gaivota não nasceu
dentro de si
um vagalume ali jazia preso.
Surtando
Saca
quando canções
não me dizem mais nada
abstratos angustiados
debaixo de uma camiseta de grife
sobre um amor danado
que a Amy não resolve
eu
olho pela janela
vendo o cubismo de Picasso
surgir do cubismo de Braque
e se quebrar pelas esquinas
formigantes
pelas luzes
que ainda cantam para
o mundo menos
para mim
que não escuto, nem sinto
além de um acorde depois do outro
sem que o meu ouvido registre
um ai
Aí
então
sinto que é preciso
inventar um som precioso
apaixonicizante por alucinismos
e grito como Munch desesperos
Bachbatanas Bachbarrizando
e a razão some pro nada
pedindo socorro ou
por sangue
nas veias excitadas
mineiras ou argentinas
ourisanécticas matissinianas
goyastrais adMiróticas
poetronizéptycas
onde faço faloniciróferas
onde encontro o amor
poltronizado
e
logo
Duchamp canta
no espaço colorido
tecniramificando as sensactions
enquanto eu janto Dubuffet
doces formigas de Dali
como um tubarão
que tem uma jaws abocanhante
como a curvatura pi da terra
com suas pirâmides hieroglificas
e figuras hieráticas
que essas
sim
mandam beijinhos
por debaixo das colunas
e do nariz do sacerdote
como uuummmmmmmmmm
smaaaaaccccckkkkkkk
kkkkk!!!!!!!!!!
!!!!!
!!!
!
porque amacia tanto silêncio?
O que teu aconchego me esconde?
Será segredos mansos criados sob as cobertas?
Será o afogar de metáforas
que teu dono arrebanha não sei aonde?
Certo que o tranquilo e o escuro
são seus companheiros nessa insana alcova
aonde se aninham os indomados sentimentos
a inundar seus adormecidos pensamentos
às vezes, insones, nervosos
às vezes, puros ou sofridos, temerosos
mas, também aqueles desejos fremidos
que a fantasia a se excitar desova
Porém, quem será o dono tão presumido
a temer sua inspiração violada
e o seu oculto Parnaso de repente percebido?
Não sabe ele que ser Apolo
é não ser quase nada!
E mais vale iluminar seus olhos com o dia
para que a Razão e a sublime Poesia
lhe amem de madrugada?
Se for,
tola imaginação,
às vezes, o travesseiro se arrebenta
e os sonhos nele contidos
serão plumas devassadas
flutuando quando venta
e os versos esquecidos como folhas
de uma árvore seca e amarelenta,
serão, um dia,
lenha seca queimando inútil
numa casa fria que ninguém frequenta.