quinta-feira, 18 de março de 2010

A infanta e eu

                                                                                                                     
                                                                                                                                    Las meninas - Velasquez


a mão se levanta

caem os pudores em não ser mais que eu

um dedo se ergue e aponta para mim

como um louco aponta para o céu


outro dedo surge e aponta para uma ave que canta

e já não sou eu mais o que flutua

mas o que percebeu agora

que os outros dedos da mão apertam a minha garganta

para que não diga nunca mais: - sou eu!


eu me levanto

e aponto a vista para a vida que me havia conhecido

e de mim temo o juízo

que por ela me perdeu


outra mão se levanta e diz calma!

é melhor não contar com o que não existe

com o que o que não houve

e nunca te pertenceu nem por um momento

para nunca mais pensar: - sou eu!


depois

dois dedos estalam

a ideia que me trouxe é a ideia

de quem não sou eu

a cabeça se ergue e se espanta a ver tudo que se passou

e não adianta


a vida é aquela infanta

a olhar o reflexo que não reflete quem se esqueceu

o olhar vê que nenhuma escolha é santa

com exceção daquela que no viver não se distorce

também não desfez o sentido do aprender

de que é tudo é teu para construir

um mundo de miragens a girar, girar


e um dia apenas nesse turbilhão a perceber

que uma mão se levanta e cai a cortina

e

por detrás

à olhar

o todo eterno

que transforma tudo daquele passageiro

uma simples lembrança do passado

em um pequeno camafeu




Nenhum comentário:

Postar um comentário