um lugar esquecido de Deus
esse estranho lugar
entre o será e o ido
que me veste
de um mundo perdido
ou me despe de tudo
que se perdeu
ali
onde tantos dias se seguiram
e não revelaram ainda
o que será cumprido
como um segredo das tumbas
todo esquecido
um Vale dos Reis
onde só os tempos existiram
e aonde ainda vive fremente
o que sou eu ou o que faço em mim
e que necessariamente
se escondeu
esse vazio cheio
de espanto
esse retiro
esse convento
esse circo
prisão
ou paraíso
não há jeito
não há riso
talvez apenas
só um aviso
ou grito
ou acalanto
e mais uma vez
minha mão tremeu
talvez
um som poluído
com tudo isso
que acontece
mas caminho e espero
no vento do inimaginável
que de fato em minha alma
se rompeu
esse vão desconhecido
que me persegue
não esmorece seu compromisso
em nenhum canto
mesmo num lugar longínquo
do hipogeu
o carrego cada segundo
enchendo
do meu vivido
esse espaço que à mim
corresponde
projeto do que não sei como existe
ou de como se deu
ainda bem que não sou nenhum santo
nem nada parecido
apenas um ser procurando saída
espanto
atrás de espanto
ao seguir seus dias
com sua presença
atrás do fio para a saída
que é cada linha, a suma verdade
que sempre sonhante de si escapa
como um destino que trama ou intui
e no caderno do fim dos dias
rindo
escreveu
foto de Brassai